Última atualização: 17 de setembro de 2020
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Em meio a um período de grandes transformações, de todos os tipos e em todas as áreas, envolvendo epidemia e a interminável contagem de mortes, dados de média móvel, desenvolvimento de vacinas, isolamento social, recessão econômica mundial, desemprego, queimadas em várias partes do planeta, oscilações nos valores das ações das Big Techs, guerras frias, quentes ou comerciais entre EUA e China, protestos contra Lukashenlo na Bielorrúsia, opositor russo envenenado, entre tantos outros, um tema envolvendo dois personagens, provavelmente desapercebido pela maioria, me chamou a atenção: os julgamentos de Julian Assange e Edward Snowden.
Relembrando… Assange, fundador do Wikileaks, jornalista e ciberativista australiano, encontra-se sob custódia da polícia de Londres desde abril do ano passado, sob acusação de ter violado as condições estabelecidas na sua fiança em 2010. Isso depois de ter ficado durante sete anos refugiado na embaixada do Equador em Londres. O jornalista passou a ser internacionalmente conhecido há mais de dez anos, quando publicou uma série de documentos sigilosos do governo americano, detalhando o ataque aéreo a Bagdá em 12 de julho de 2007, e outros registros de guerra do Afeganistão e do Iraque. O Wikileaks atraiu a atenção e teve como aliado meios tradicionais como o El País, Le Monde, Der Spiegel, The Guardian e The New York Times, na divulgação de conteúdos secretos da diplomacia americana, chegando a ser indicado ao Prêmio Nobel da Paz. O que está sendo julgado nesse momento é se ele vai ou não ser extraditado do Reino Unido para os Estados Unidos, sob acusação de espionagem e de colocar vidas de militares americanos em risco. Isso acontecendo, apesar de pouco provável, Assange corre o risco de ser sentenciado a morte.
Quanto ao Snowden, sua história virou filme. Ex-administrador de sistemas da CIA e ex-contratado da NSA, em 2013 tornou públicos detalhes de vários programas que constituem o sistema de vigilância global da NSA americana. A revelação deu-se através dos jornais The Guardian e The Washington Post, apresentando detalhes da Vigilância Global de comunicações e tráfego de informações executada através de vários programas, entre eles o programa de vigilância PRISM dos Estados Unidos. Em reação às revelações, o Governo dos Estados Unidos acusou-o de roubo de propriedade do governo, comunicação não autorizada de informações de defesa nacional e comunicação intencional de informações classificadas como de inteligência para pessoa não autorizada. Sete anos depois, um tribunal de segunda instância dos EUA considerou a ação ilegal, julgando que os líderes dos serviços de Inteligência “mentiram” sobre o reconhecimento e uso de metadados, obtidos através de milhões de telefonemas gravados em todo o mundo.
O tema que me refiro é sobre segurança das informações. Acredito que esses julgamentos não mudarão o curso da história originada por Assange ou Snowden. Não importa se são bandidos ou mocinhos. Porém, se analisarmos nos detalhes, muito do que discutimos hoje estão ligados a esses personagens. O mundo digital facilitou a comunicação mundial, mas também abriu brechas para as delações (e provas) sobre o monitoramento e uso indevido das informações daqueles que detêm o poder. Instituições, empresas e governos desenvolveram artifícios para descobrir as diferenças entre o que é falado oficialmente e o comportamento ou as intenções das pessoas comuns ou poderosas. Neste mundo de informações abundantes, facínoras contra atacaram com Fake News, onde cada um acredita naquilo que convém, mesmo que as provas sejam evidentes. Atualmente contrariamos o senso comum de que contra fatos não há argumentos. Sempre haverá novas versões, teorias, explicações e contestações.
O ponto que me chama a atenção não é então somente a divulgação desses dados, mas como eles são obtidos. Estamos às vésperas de uma nova eleição nos EUA. O atual presidente foi eleito com forte suspeita de apoio dos russos. A estratégia desta ajuda teria sido desviar o foco da atenção americana para a China. Observando as manchetes internacionais, podemos concluir que deu certo. A polêmica em relação a tecnologia 5G, um dos pilares de uma grande disputa de poder e de controle das informações, incrementou a crise sino-americana. Todas as acusações em relação a potencial vigilância e monitoramento de informações pelas empresas chinesas são justificadas, pois foi exatamente o que os americanos fizeram e fazem na atual geração tecnológica, o 4G. Snowden que nos diga. Portanto, a discussão não está no ato em si, mas quem terá poder para fazê-lo. E com qual objetivo.
A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), é a proposta brasileira para regulamentar as atividades de tratamento de dados pessoais. Desta forma passamos a fazer parte do grupo de países que contam com uma legislação específica para proteção de dados. Nos inspiramos em regulamento semelhante da União Europeia (GPDR) que teve como objetivo principal a segurança e privacidade dos seus cidadãos. Esse movimento europeu ocorreu visando se distanciar da disputa entre o uso destas informações para fins comerciais defendido pelos americanos e a vigilância controladora imposta pelos chineses. Porém, nenhuma lei local será eficaz contra atividades que não respeitam fronteiras. Temas de interesses difusos como a pandemia, o aquecimento global e a preservação ambiental, devem ser discutidos em fóruns internacionais. A segurança das informações, em todos os níveis, é com certeza um desses temas.
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