Negócios: reorientação maleável

Última atualização: 18 de agosto de 2020
Tempo de leitura: 4 min

A grande surpresa da vida é descobrir que, a história real e vivida de outras pessoas ou de outras épocas, quase nunca correspondem exatamente àquilo que imaginamos. A arrogância e os prejulgamentos corroem e desfiguram as capacidades analíticas, comprometendo nossas descobertas. Os efeitos da pandemia comprovadamente serão mais difíceis e prolongados do que inicialmente projetávamos. Tudo indica que alguns segmentos de negócios sofreram mais impactos do que outros, de modo que a recuperação das atividades não será uniforme.

Mesmo assim, ainda com a visão prejudicada pelo nevoeiro, já identificamos nuances de uma retomada econômica, social e cultural. Costumes, rotinas e comportamentos mudaram nos últimos meses: trabalho, saúde, consumo, alimentação, transporte, moradia entre tantos outros. Como será, é difícil dizer. Porém, uma coisa podemos afirmar: não voltará a ser igual ao que era. Estamos enfrentando um novo fator disruptivo. Esses fatores têm aparecido com maior frequência. O destino nunca foi tão manejável como atualmente. Gerenciar a incerteza sempre fez parte das competências humanas. A crescente interdependência econômica e a instabilidade política conspiraram para tornar o futuro cada vez mais obscuro.

Fato é que o deslocamento das mudanças está acelerado, constante e permanente. Recebemos notícias e informações em abundância o que, muitas vezes, prejudica compreender o momento que passamos. É difícil dimensionar e fazer comparações dos impactos na vida das pessoas, dos negócios ou dos países. O sucesso desta restauração exige exploração das conjunturas e dos contextos, que nascem da combinação de opiniões, conversas, estudos, dados e informações coletadas de diversas fontes. Velhos remédios normalmente não curam doenças novas.

Mal descobrimos uma forma de neutralizar os efeitos das fake news, já observamos um novo comportamento preocupante: a cultura do cancelamento. Nossa evolução muitas vezes é interrompida por pensamentos radicais e irracionais. Não podemos diante de uma divergência de opinião, simplesmente negar o direito de existência. A flexibilidade de ideias deveria ser uma virtude, e a tolerância uma prática. Em todos os campos da sociedade.

No campo da educação temos uma oportunidade única de atualizar conceitos. A tecnologia nos abre enormes alternativas de aprendizado. Isso não significa trocar ou eliminar o contato físico, pois sua importância nunca foi questionada. Mas é a forma de não pararmos de maneira absoluta. Caberá aos educadores e educandos descobrirem novas técnicas de adaptação ao processo de transferência do conhecimento.

Na saúde, epicentro desta revolução, descobrimos a importância dos cuidados básicos. Estamos surpresos com a dificuldade de viver sem contato físico. Exatamente no momento em que tudo parecia estar a nossa disposição nas pontas dos dedos. A controvertida ciência, negada por alguns, questionada por outros, parece incompreendida por todos quando se trata dos tempos, testes e protocolos. A superioridade dos avanços tecnológicos também fora assimétrica. Provavelmente deixaremos de priorizar perfumes e valorizaremos anticépticos.

Quando refletimos sobre o ambiente de trabalho, desejar e exigir presença física nos escritórios é inquestionavelmente a maneira mais fácil fazer os colaboradores assimilarem a cultura da empresa. Os novos contratados passam a entender o que é esperado deles, observando como se comportam os que os rodeiam, e não lendo as declarações de valores e missão da empresa. Perdendo o comportamento de rebanho, os líderes precisarão ser muito mais flexíveis e maleáveis em relação a cultura organizacional dos negócios. A tomada de decisões transparente e a definição clara de normas se tornarão exponencialmente mais importantes. Recorrer ao uso de ferramentas de vigilância será cada vez mais comum, resta descobrir o quanto será eficiente. O patrulhamento corporativo mina a confiança e a segurança psicológica dos colaboradores.

Tardou uma reorientação social. Basta de ideologias de esquerda, centro ou direita. O que precisamos é de valores de dentro para fora. Criatividade e vencer os desafios, muito incentivado no mundo dos negócios, deveriam ser canalizados para inaugurar novos modelos contemporizadores de convivência humana. A competição não deve e não pode desaparecer. Mas devemos rever os custos. A humanidade sempre foi versátil para encontrar alternativas ao longo de sua existência, e não poderá ser diferente agora. Cada texto que leio, reunião (videoconferência) que participo ou consulta a especialistas econômicos que faço, recebo sinais confusos. Claramente todos têm pontos de vista, convicções, crenças, teorias e teses diferentes, mesmo quando concordam. O que me faz lembrar da frase proferida por Jim Barksdale, ex-CEO da Netscape, no melhor período da empresa, quando brilhava como o grande navegador da web: “Se tivermos dados, vejamos os dados. Se tudo o que temos são opiniões, vamos com as minhas.”

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Marcelo Molnar

Sobre o autor

Marcelo Molnar é sócio-diretor da Boxnet. Trabalhou mais de 18 anos no mercado da TI, atuando nas áreas comercial e marketing. Diretor de conteúdo em diversos projetos de transferência de conhecimento na área da publicidade. Consultor Estratégico de Marketing e Comunicação. Coautor do livro "O Segredo de Ebbinghaus". Criador do conceito ICHM (Índice de Conexão Humana das Marcas) para mensuração do valor das marcas a partir de relações emocionais. Sócio Fundador da Todo Ouvidos, empresa especializada em monitoramento e análises nas redes sociais.

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